quinta-feira, 3 de março de 2011

O Tempo da Quaresma

Desde o século IV, cada ano a Igreja prepara seus fiéis para sua festa central, da Páscoa, com um tempo especial, chamado quaresma. A palavra indica um período de 40 dias.

A quaresma vai desde a quarta-feira de cinzas até a Semana Santa, assumida como a Grande Semana do Mistério fundamental do Cristianismo. A Semana Santa começa com o Domingo de Ramos e culmina na Páscoa da Ressurreição. A quaresma visa ao crescimento espiritual. Leva a fazer o confronto entre o ideal e o real, ou seja, leva a teoria à prática, conformando a vida com a mensagem do Evangelho. Neste sentido se fala de um retiro espiritual, com destaque à oração e à penitência, sempre de olhos fixos na meta, que é a acolhida de Cristo vivo e ressuscitado.

O número 40 é emblemático. Os antigos, principalmente a partir de Pitágoras, tiraram os números do segundo grau de abstração e lhes atribuíram significados mais profundos com uma decisiva incidência na vida humana. Assim atribuíram ao número 4 o simbolismo do universo material, pelos quatro elementos que o constituem: terra, água, fogo e ar. O zero, segundo a Bíblia, significa o tempo da vida sobre a terra, com suas provações e dificuldades.

A quaresma, pelo número 40, tem uma forte ressonância bíblica: representa os 40 dias do dilúvio, os 40 anos da peregrinação dos hebreus pelo deserto; os 40 dias de Moisés e de Elias na Montanha de Deus; os 40 dias de jejum de Jesus, antes de iniciar sua vida pública; os 400 anos da estada dos judeus no Egito... Em cada um destes símbolos existe a necessidade de criar um clima novo, abrindo o coração para um grande acontecimento.

Os cristãos, durante a quaresma, se empenham em três grandes linhas de ação, que constituem o eixo da vida religiosa: a oração, a penitência e a caridade. Sintetizam a busca do reino de Deus na luta pela justiça, pela paz e pelo amor.

A tríplice linha de ação continua, com toda a validade, ainda que sempre com renovadas conotações. Antigamente se calcava no jejum e abstinência de carne, no plano da alimentação. Esta prática volta à atualidade pela necessidade de controlar o peso, cujo excesso atinge nada menos de 40% de nossa população, com graves incidências sobre a saúde pública.

Hoje esta norma se estende para campos que exasperam a cobiça humana. Envolve o uso dos bens materiais, tanto da internet quanto do automóvel, tanto da televisão quanto do cigarro, das guloseimas, drogas, diversões. Trata-se de novas formas de educação e de orientação da vida. A virtude está no meio. Procura evitar os excessos. Mas, em alguns casos, exige tolerância zero, como nos desregramentos sexuais e nas drogas. Falamos então de abstinência. Ali se assentam hoje as práticas quaresmais, numa atitude de penitência e de fé.

A quaresma, contudo, nos quer convidar à prática de duas práticas positivas, que devem caracterizar nossa religiosidade: o contato com Deus e com o próximo, respectivamente, pela oração e pelo amor fraterno. Nossa vida é feita de relação. Exige um contínuo aprofundamento para proporcionar a devida realização: relação consigo mesmo, pelo autodomínio e pelo equilíbrio de todas as tendências; relação com os outros, pelo amor fraterno, que envolve perdão, superação do ódio e da violência e uma contínua busca de reconciliação; relação com o mundo, pelo respeito à natureza e zelo pelo meio ambiente, e relação com Deus, com clareza da meta da caminhada, transcendendo as vicissitudes dos tempos. É neste contexto que se insere a Campanha da Fraternidade.

Fonte! Coluna A Voz do Pastor, por Dom Dadeus Grings, publicado no Jornal do Comércio de Porto Alegre (RS), na edição do dia 03 de março de 2011.

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