Na
Quarta-feira de Cinzas os católicos iniciam o tempo da Quaresma,
preparação para a Páscoa, a festa da ressureição de Cristo. Durante o
período de 40 dias que antecede a Paixão de Jesus, o cristão é chamado a
voltar-se para Deus, de modo especial pelo jejum, pela oração e pela
esmola.
O
Papa Francisco, na mensagem para a Quaresma deste ano (leia na íntegra
abaixo), observa que esses são meios propostos pela Igreja para o fiel
crescer na amizade com o Senhor. Utilizando da parábola do homem rico e
do pobre Lázaro, Francisco destaca que a Quarema, que começa dia 1º de
março, “é um tempo propício para abrir a porta a cada necessitado e nele
conhecer o rosto de Cristo”.
Através
da Campanha da Fraternidade, a Igreja do Brasil, durante o tempo da
Quarema, traz mais uma vez ao debate o tema do cuidado com a casa comum,
a “Irmã e Mãe Terra”, como Francisco escreve na encíclica Laudato Si.
Campanha da Fraternidade propõe debate sobre os biomas brasileiros. Foto: Amanda Fetzner Efrom
A
Campanha da Fraternidade de 2017 apresenta como tema “Fraternidade:
biomas brasileiros e defesa da vida”. “Ao abordarmos os biomas
brasileiros e lembrarmos dos povos originários que neles habitam,
trazemos à meditação a obra benfazeja de Deus”, afirma o
secretário-geral da CNBB, Dom Leonardo Ulrich Steiner.
Também
em vista da preparação para a Páscoa o Regional Sul 3 da CNBB propõe
aos católicos encontros em torno da Palavra de Deus, por meio de uma
material que já está disponível nas paróquias das 18 (aqui)dioceses
gaúchas. Trata-se de um kit produzido com roteiros de encontros e
objetos que estimulam uma ação concreta para o período (clique aqui para saber mais).
“Durante
a Quaresma, rezemos uns pelos outros para que, participando na vitória
de Cristo, saibamos abrir nossas portas ao frágil e ao pobre. Então
poderemos viver e testemunhar em plenitude a alegria da Páscoa”, exorta o
Papa Francisco.
Leia na íntegra a mensagem do Papa Francisco para a Quaresma deste ano
Amados irmãos e irmãs!
A
Quaresma é um novo começo, uma estrada que leva a um destino seguro: a
Páscoa de Ressurreição, a vitória de Cristo sobre a morte. E este tempo
não cessa de nos dirigir um forte convite à conversão: o cristão é
chamado a voltar para Deus “de todo o coração” (Jl 2, 12), não se
contentando com uma vida medíocre, mas crescendo na amizade do Senhor.
Jesus é o amigo fiel que nunca nos abandona, pois, mesmo quando pecamos,
espera pacientemente pelo nosso regresso a Ele e, com esta espera,
manifesta a sua vontade de perdão (cf. Homilia na Santa Missa, 8 de
janeiro de 2016).
A
Quaresma é o momento favorável para intensificarmos a vida espiritual
através dos meios santos que a Igreja nos propõe: o jejum, a oração e a
esmola. Na base de tudo isto, porém, está a Palavra de Deus, que somos
convidados a ouvir e meditar com maior assiduidade neste tempo. Aqui
queria deter-me, em particular, na parábola do homem rico e do pobre
Lázaro (cf. Lc 16, 19-31). Deixemo-nos inspirar por esta página tão
significativa, que nos dá a chave para compreender como temos de agir
para alcançarmos a verdadeira felicidade e a vida eterna, incitando-nos a
uma sincera conversão.
1. O outro é um dom
A
parábola inicia com a apresentação dos dois personagens principais, mas
quem aparece descrito de forma mais detalhada é o pobre: encontra-se
numa condição desesperada e sem forças para se solevar, jaz à porta do
rico na esperança de comer as migalhas que caem da mesa dele, tem o
corpo coberto de chagas, que os cães vêm lamber (cf. vv. 20-21). Enfim, o
quadro é sombrio, com o homem degradado e humilhado.
A
cena revela-se ainda mais dramática, quando se considera que o pobre se
chama Lázaro, um nome muito promissor pois significa, literalmente,
“Deus ajuda”. Não se trata duma pessoa anónima; antes, tem traços muito
concretos e aparece como um indivíduo a quem podemos atribuir uma
história pessoal. Enquanto Lázaro é como que invisível para o rico, a
nossos olhos aparece como um ser conhecido e quase de família, torna-se
um rosto; e, como tal, é um dom, uma riqueza inestimável, um ser
querido, amado, recordado por Deus, apesar da sua condição concreta ser a
duma escória humana (cf. Homilia na Santa Missa, 8 de janeiro de 2016).
Lázaro
ensina-nos que o outro é um dom. A justa relação com as pessoas
consiste em reconhecer, com gratidão, o seu valor. O próprio pobre à
porta do rico não é um empecilho fastidioso, mas um apelo a converter-se
e mudar de vida. O primeiro convite que nos faz esta parábola é o de
abrir a porta do nosso coração ao outro, porque cada pessoa é um dom,
seja ela o nosso vizinho ou o pobre desconhecido. A Quaresma é um tempo
propício para abrir a porta a cada necessitado e nele reconhecer o rosto
de Cristo. Cada um de nós encontra-o no próprio caminho. Cada vida que
se cruza conosco é um dom e merece aceitação, respeito, amor. A Palavra
de Deus ajuda-nos a abrir os olhos para acolher a vida e amá-la,
sobretudo quando é frágil. Mas, para se poder fazer isto, é necessário
tomar a sério também aquilo que o Evangelho nos revela a propósito do
homem rico.
2. O pecado cega-nos
A
parábola põe em evidência, sem piedade, as contradições em que vive o
rico (cf. v. 19). Este personagem, ao contrário do pobre Lázaro, não tem
um nome, é qualificado apenas como «rico». A sua opulência manifesta-se
nas roupas, de um luxo exagerado, que usa. De facto, a púrpura era
muito apreciada, mais do que a prata e o ouro, e por isso se reservava
para os deuses (cf. Jr 10, 9) e os reis (cf. Jz 8, 26). O linho fino era
um linho especial que ajudava a conferir à posição da pessoa um caráter
quase sagrado. Assim, a riqueza deste homem é excessiva, inclusive
porque exibida habitualmente: “Fazia todos os dias esplêndidos
banquetes” (v. 19). Entrevê-se nele, dramaticamente, a corrupção do
pecado, que se realiza em três momentos sucessivos: o amor ao dinheiro, a
vaidade e a soberba (cf. Homilia na Santa Missa, 20 de setembro de
2013).
O
apóstolo Paulo diz que “a raiz de todos os males é a ganância do
dinheiro” (1 Tm 6, 10). Esta é o motivo principal da corrupção e uma
fonte de invejas, contendas e suspeitas. O dinheiro pode chegar a
dominar-nos até ao ponto de se tornar um ídolo tirânico (cf. Exort. ap.
Evangelii gaudium, 55). Em vez de instrumento ao nosso dispor para fazer
o bem e exercer a solidariedade com os outros, o dinheiro pode-nos
subjugar, a nós e ao mundo inteiro, numa lógica egoísta que não deixa
espaço ao amor e dificulta a paz.
Depois,
a parábola mostra-nos que a ganância do rico fá-lo vaidoso. A sua
personalidade vive de aparências, fazendo ver aos outros aquilo que se
pode permitir. Mas a aparência serve de máscara para o seu vazio
interior. A sua vida está prisioneira da exterioridade, da dimensão mais
superficial e efémera da existência (cf. ibid., 62).
O
degrau mais baixo desta deterioração moral é a soberba. O homem
veste-se como se fosse um rei, simula a posição dum deus, esquecendo-se
que é um simples mortal. Para o homem corrompido pelo amor das riquezas,
nada mais existe além do próprio eu e, por isso, as pessoas que o
rodeiam não caiem sob a alçada do seu olhar. Assim o fruto do apego ao
dinheiro é uma espécie de cegueira: o rico não vê o pobre esfomeado,
chagado e prostrado na sua humilhação.
Olhando
para esta figura, compreende-se por que motivo o Evangelho é tão claro
ao condenar o amor ao dinheiro: “Ninguém pode servir a dois senhores: ou
não gostará de um deles e estimará o outro, ou se dedicará a um e
desprezará o outro. Não podeis servir a Deus e ao dinheiro” (Mt 6, 24).
3. A Palavra é um dom
O
Evangelho do homem rico e do pobre Lázaro ajuda a prepararmo-nos bem
para a Páscoa que se aproxima. A liturgia de Quarta-Feira de Cinzas
convida-nos a viver uma experiência semelhante à que faz de forma tão
dramática o rico. Quando impõe as cinzas sobre a cabeça, o sacerdote
repete estas palavras: “Lembra-te, homem, que és pó da terra e à terra
hás de voltar”. De facto, tanto o rico como o pobre morrem, e a parte
principal da parábola desenrola-se no Além. Dum momento para o outro, os
dois personagens descobrem que nós “nada trouxemos ao mundo e nada
podemos levar dele” (1 Tm 6, 7).
Também
o nosso olhar se abre para o Além, onde o rico tece um longo diálogo
com Abraão, a quem trata por “pai” (Lc 16, 24.27), dando mostras de
fazer parte do povo de Deus. Este detalhe torna ainda mais contraditória
a sua vida, porque até agora nada se disse da sua relação com Deus. Com
efeito, na sua vida, não havia lugar para Deus, sendo ele mesmo o seu
único deus.
Só
no meio dos tormentos do Além é que o rico reconhece Lázaro e queria
que o pobre aliviasse os seus sofrimentos com um pouco de água. Os
gestos solicitados a Lázaro são semelhantes aos que o rico poderia ter
feito, mas nunca fez. Abraão, porém, explica-lhe: “Recebeste os teus
bens na vida, enquanto Lázaro recebeu somente males. Agora, ele é
consolado, enquanto tu és atormentado” (v. 25). No Além, restabelece-se
uma certa equidade, e os males da vida são contrabalançados pelo bem.
Mas
a parábola continua, apresentando uma mensagem para todos os cristãos.
De facto o rico, que ainda tem irmãos vivos, pede a Abraão que mande
Lázaro avisá-los; mas Abraão respondeu: “Têm Moisés e os Profetas; que
os oiçam” (v. 29). E, à sucessiva objeção do rico, acrescenta: “Se não
dão ouvidos a Moisés e aos Profetas, tão-pouco se deixarão convencer, se
alguém ressuscitar dentre os mortos” (v. 31).
Deste
modo se patenteia o verdadeiro problema do rico: a raiz dos seus males é
não dar ouvidos à Palavra de Deus; isto levou-o a deixar de amar a Deus
e, consequentemente, a desprezar o próximo. A Palavra de Deus é uma
força viva, capaz de suscitar a conversão no coração dos homens e
orientar de novo a pessoa para Deus. Fechar o coração ao dom de Deus que
fala, tem como consequência fechar o coração ao dom do irmão.
Amados
irmãos e irmãs, a Quaresma é o tempo favorável para nos renovarmos,
encontrando Cristo vivo na sua Palavra, nos Sacramentos e no próximo. O
Senhor – que, nos quarenta dias passados no deserto, venceu as ciladas
do Tentador – indica-nos o caminho a seguir. Que o Espírito Santo nos
guie na realização dum verdadeiro caminho de conversão, para
redescobrirmos o dom da Palavra de Deus, sermos purificados do pecado
que nos cega e servirmos Cristo presente nos irmãos necessitados.
Encorajo todos os fiéis a expressar esta renovação espiritual, inclusive
participando nas Campanhas de Quaresma que muitos organismos eclesiais,
em várias partes do mundo, promovem para fazer crescer a cultura do
encontro na única família humana. Rezemos uns pelos outros para que,
participando na vitória de Cristo, saibamos abrir as nossas portas ao
frágil e ao pobre. Então poderemos viver e testemunhar em plenitude a
alegria da Páscoa.
Vaticano, 18 de outubro de 2016.
Festa do Evangelista São Lucas
FRANCISCO
Fonte! Sítio da Arquidiocese de Porto Alegre! http://www.arquidiocesepoa.org.br/single-post/2017/02/20/Quaresma-e-Campanha-da-Fraternidade-come%C3%A7am-no-pr%C3%B3ximo-dia-1%C2%BA-de-mar%C3%A7o
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